sexta-feira, 19 de março de 2010

Oi, André!

O pessoal aqui em casa até que se vira: meu pai é minha mãe trabalham, meu irmão ta tirando faculdade, minha irmã mais velha também trabalha, só vejo eles de noite. Mas minha irmã mais moça nem trabalha nem estuda, então toda hora a gente esbarra uma na outra. Sabe o que é que ela diz?
Que é ela que manda em mim, vê se pode. Não posso trazer nenhuma colega aqui: ela cisma que criança faz bagunça em casa. Não posso nunca ir na casa de ninguém: ela sai, passa a chave na porta, diz que vai comprar comida (ela vai é namorar) e eu fico aqui trancada pra atender telefone e dizer que ela não demora. Bem que eu queria pular a janela, mas nem isso dá pé: sexto andar.
Essa irmã que eu to falando é bonita pra burro, você precisa ver. Nem sei o que é que ela é mais: se bonita ou mascarada. Imagina que outro dia ela me disse: “Eu sou tão bonita que não preciso trabalhar nem estudar: tem homem querendo me sustentar.”
Aí eu inventei que o Roberto (um grã-fino que ela quer namorar) tinha falado mal dela. “Sabe o que é que ele andou espalhando?” ¾ eu falei ¾ “que você é tão burra que chega a meter aflição.” Levei uns cascudos que eu vou te contar. E de noite, quando o pessoal chegou (fui cedo pra cama porque vi logo que ia dar galho), ela contou que eu continuava a maior inventadeira do mundo. Aí foi aquela coisa: o pessoal todo ficou contra mim. Fui dormir na maior fossa de ser criança podendo tão bem ser gente grande. Não era para eu ter inventado nada; saiu sem querer. Sai sempre sem querer, o que é que eu posso fazer? E dá sempre confusão, é tão ruim! Escuta aqui, André, você me faz um favor? Pára com essa mania de telegrama e me diz o que é que eu faço pra não dar mais confusão!
Por favor, sim?
Raquel

Lygia Bojunga Nunes. A bolsa amarela.
Interpretação do texto:
1. Responda:
a. Como são denominados textos como esse?
b. Observe a fonte do livro. Quem é a autora do livro de onde esse texto foi retirado?
c. Na história, quem narra os acontecimentos da carta?
d. Para quem a carta foi destinada?
e. Que tipo de confusão a narradora afirma que vive se metendo?
f. De tudo o que você estudou, o que ficou faltando na carta?

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